sobre a obra FOTOGRAMAS DE AGOSTO
(2a ed,2008)(Anome Livros)
do poeta Luiz Edmundo Alves
Fotografias líricas da saudade
2/3
/A Nação/
Tecendo numa mortalha lírica (a palavra eterniza o que
já morreu?) o conceitode Nação (ou vivemos num 'Estado
que não é Nação?'), a voz poética apresenta suas impressões
da Terra, do Povo, do Naturalismo Indígena, do Misticismo
Tupi, da Civilização Lusitana, do Jeitinho Brasileiro, da
Democracia Racial, ou seja, tudo o que nos empurram
goela-abaixo desde as carteiras escolares. Contudo, numa
visão fragmentada, emotiva, cubista, saltando de uma 'tradição'
a outra (de modo a deixar louco qualquer antropólogo!) de
modo a anunciar : “minha nação descendo o morro”, em vozes
de índios, negros, mulatos, sambistas, políticos, malandros,
guerreiros, músicos, além do impávido 'poeta da nação' (será
o Castro Alves?) com “seu vocabulário bizarro e sua
sensibilidade dos ventos” para inventar um poema “para
reconstruir na passarela das utopias nacionais”, uma vez
que os “poetas são desconstrutores”. Adeus àquela
propaganda de “o poeta é a voz da raça” ?
E desconstrução é o que o Autor faz aqui. Em versos livres,
soltos, sem eira nem beira, sem rumos, atirando pratodolado,
sem perdoar figuras históricas e lendas urbanas.
“transforma-se a nação
a cada instante. como uma adolescente
de 500 anos, com códigos próprios
de insegurança:
garotos roubam velhinhos à
luz lilás do crepúsculo”
e as imagens cubistas em colagem se sucedem (o Autor é
videomaker) numa colcha de retalhos linguística, em dialetos
afro, em sotaque caipira, em hinos de guerra indígenas, em
samba-enredos, em propagandas comerciais, em jogos-de-
palavras, presas em aliterações, assonâncias, metáforas
“a musa de biquini e biquinho
de batom ou blush.
Na tela, bela / boa/ borbulhante.
Lá vem ela, vem outra. Elas,
barbarelas”
e não importa se é Carmen Miranda, Regina Duarte (a
'namoradinha do Brasil'), Vera Fischer, Gisele Bündchen
ou Juliana Paes, não interessa, pois sempre haverá uma
celebridade a rebolar em nome da Beleza Nacional.
Que abre sempre o desfile dos aldeões, dos crentes, dos
heróis, dos excluídos, dos violentados, dos privilegiados, dos
revoltosos, dos mestiços, tudo disposto em fragmentos de
um imenso painel (a lembrar aqueles murais mexicanos,
vejam em http://www.klepsidr a.net/klepsidra6 /muralismo. html ,
http://fbuch. com/murals. htm
e http://www.diegoriv era.com/murals/ index.php ) onde
tudo se confunde, em múltiplas perspectivas de uma
arte cubista.
Um desfile de Macunaímas, Martins Cererê, Zecas Tatu,
Cobras Norato, Geraldos Viramundo, Severinos e Tietas do
Agreste, toda uma fauna de personagens brasileiras que
personificam nossas 'mazelas nacionais' (personas e
chavões que todos nós conhecemos.. .) Rodinhas de capoeira,
famílias sem-terra, cantigas de candomblé, amuletos e patuás,
tudo vai sendo colado num mosaico verbal, entrecortado por
exclamações, pragas, invocações, resmungos, refrões, tudo
porque o Poeta que vê quer entender: “quero entender /
quero entender”. Mas, aqui, a Arte consegue o êxito de
'descrever', 'testemunhar' .
/as Subtilezas/
Há um poema na 1a parte (digamos assim) que está
deslocado. O Autor que me desculpe. Mas na p. 30 vemos
um poema cheio de subtilezas, onde o Autor (vamos chamá-lo
de 'Luiz') se deixa em comparação com outros entes (irmãos?
parentes? ) Um certo 'Mário' que devota-se à pecuária, um
outro 'Ananias', a especializar em vacas leiteiras, um tal 'Zé',
a lidar com agriculturas, mas por fim, um 'Luiz' que se limita
à cidade e à escrita, sem ganhar um centavo com isso (triste
sina!) e a receber palavras de incentivo (veras ou cínicas),
“e colhe uns tapinhas nas costas”.
Ora, esse é o 'espírito', a 'atmosfera', aqui das Subtilezas.
Impressões de poeta, sentimentalismos de poeta, dúvidas
de poeta, emails trocados com uma poeta (Ana Elisa Ribeiro,
conceituadíssima! ), cadernos de poeta, insônias de poeta.
O que (afinal de contas!) é esse lance de ser poeta? É
sentir-se sacudido por 'sentimentos brutais'? É possuir
“dedos tão sentimentais”? É sentir a “palpitação salivação
queimação”?
O que quer que seja ser Poeta é uma incógnita. (Alguém aí
sabe o que é ser astrofísico? Ou explorador-de-cavernas? ) E
somente quem mergulha na Poética (esta benção e maldição!)
sabe do que estamos falando. Ser movido por uma 'paixão
lírica' não é uma vida fácil. Ainda mais que não se sabe que
'paixão' é esta. Afinal, “a paixão é uma panorâmica / do
paraíso / ou do inferno?”
As lembranças serão algo mais do que impressões saudosas?
Por que alguns fatos marcam mais do que outros? (Quem
se lembra do que comeu semana passada no jantar de
sábado?) Ou as lembranças são invenções nossas para
justificar o 'tempo perdido'? (A menos que o jantar tenha sido
com o homem ou a mulher de nossos desejos) As fotografias
são parte desse desejo de coisificar/ossificar/petrificar o
momento fugidio. (Tanto que as pessoas não viajam mais
sem levar uma câmera – precisam ver com as lentes e flashes)
E as lembranças podem transmutar o passado numa obsessão?
“o verso é aflitivo. lembrar é aflitivo.
é aflitivo fugir, aflitivo reencontrar- me.”
E o que o Poeta não lembra, ele inventa. A Saudade dá um
empurrão.
Continua...
LdeM
http://leoliteratura.zip.net
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Há 15 anos
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