sobre ESTILHAÇOS NO LAGO DE PÚRPURA (2006)
do Poeta WILMAR SILVA/JOAQUIM PALMEIRA
O Eu-bestial diante do olhar do Outro
do Poeta WILMAR SILVA/JOAQUIM PALMEIRA
O Eu-bestial diante do olhar do Outro
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Dizem os embriologistas que o embrião humano, em seu
desenvolvimento, passa por várias fases em que se assemelha
aos animais mais primitivos na Escala Evolutiva, como peixes,
anfíbios, reptéis.
Dizem os psicólogos que a noção do Eu, quando da infância,
engloba todo o mundo, tudo é uma projeção-do-Eu, e que o
Eu-social é formado pela interação com os Outros-Eus, a partir
da aceitação destes Outros-Eus. O narcisismo propicia, assim,
a formação da Identidade. Somos algo a partir do olhar do Outro.
Dizem os Poetas que a linguagem é tão-somente uma forma
de deixar vazar, transbordar mesmo, o Eu amordaçado pelas
máscaras da Identidade.
Ciências, pseudo-Ciências e lirismos à parte, todas as
afirmações fazem algum sentido. Quando o desenvolvimento
do ser humano ainda conserva algo de animalesco, de selvagem.
Ou quando o Eu nada mais é do que reflexo do Outro, quando
vivemos querendo agradar gregos e troianos. Ou quando a fala
poética nada mais é do que desabafo torrencial de amores e
desafetos, de dores e prazeres.
O Poeta torna-se o animal que esbraveja suas intimidades para
uma platéia, uma quantidade incalculada de Outros. Assim se vê
o Eu-lírico do Autor Wilmar Silva, em metamorfoses de um Eu
estilhaçado em várias imagens sedutoramente bestiais e jogadas
contra o olhar do Ouro, espelho e “leitor hipócrita”, narciso-duplo
e “meu irmão”.
Um fluir de imagens do corpo em si-mesmo, um corpo plenamente
sondado e desvelado, integro e sacralizado, selvagem exaltado. “É
em nossa natureza selvagem que melhor nos restabelecemos de
nosso movimento anti-natural, de nossa espiritualidade...”, escreveu
F. Nietzsche em “Crepúsculo dos Ídolos”. Corpo não menor que a
alma, não uma prisão da alma, mas corpo-alma.
Em ensaio anterior, abordamos o egocentrismo – o Eu-
onipresente – em “Estilhaços”, contudo tal perspectiva sofre um
abalo quando percebemos que nos 390 versos, 33 versos fazem
referências ao Outro, desde o 1o. Verso: “eu quebrado por você
sou estilhaços no lago de púrpura”
O Outro surge como um Receptor do discurso, seja o Ser-Amado,
seja o Leitor-Cúmplice, um Outro que é a origem e o destino de
todo o discurso poético,
“você é este fogo que me entranha” (12)
ou
“mas agora no rubor de quem escreve um tormento
sou eu o mesmo que vem de longe em busca de você/
você tão febril: eu mais febril ainda/ eu sozinho” (17)
Um Outro responsável pelo desassossego do Eu, que inclinado
sobre o lago encontra a imagem do Si-mesmo, o Narciso poético
de Identidade estilhaçada. Sua identidade bestial a “cavalgar poemas”
(28), em múltiplas formas que personificam seus estados emocionais.
Continua...
por
Leonardo de Magalhaens
http://leoliteratura.zip.net/
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