quinta-feira, 23 de fevereiro de 2012

ciao! mais cidades das CIDADES INVISÍVEIS de Italo Calvino



As Cidades Invisíveis

Le Città Invisibili


Italo Calvino



trad. Livre – LdeM



Le città e i segni. 1

As cidades e os sinais . 1


“O homem caminha por vários dias entre árvores e pedras. Raramente o olho se fixa sobre uma coisa, e é quando a reconhece como o sinal de uma outra coisa: um rastro sobre a areia indica a passagem do tigre, um pântano anuncia um filão de água, as flores do hibisco, o fim da inverno. Todo o resto é mudo e intercambiável; árvores e pedras são apenas o que são.


Finalmente a viagem conduz a cidade de Tamara. Se adentra por ruas cheias de insígnias que se estendem dos muros. Os olhos não veem coisas mas figuras de coisas que significam outras coisas: a tenaz indica a casa do dentista, o jaro , a taverna; a lança, o corpo de guarda; a balança, a quitanda. Estátuas e escudos representam leões golfins torres estrelas: sinal que qualquer coisa – sabe-se o quê - tem por sinal um leão ou golfim ou torre ou estrela. Outros sinais avisam sobre o que num lugar é proibido – entrar no beco com as carroças, urinar atrás da banca de jornais, pescar com vara sobre a ponte – e aquilo que é lícito – dar de beber as zebras, jogar a bocha, cremar os cadáveres dos parentes. Da porta dos templos se veem as estátuas dos deuses, representados cada um com seus atributos: a cornucópia, a clepsidra, a medusa, pelo qual o fiel pode reconhecer-lhe e dirigir suas preces corretas. Se um edifício não apresenta nenhuma insígnia ou figura, a usa própria forma e o lugar que ocupa na ordem da cidade bastaria para indicar a função: o palácio real, a prisão, a casa da moeda, a escola pitagórica, o bordel. Também as mercadorias que os vendedores colocam à mostra sobre suas bancas valem não por si mesmas mas como sinal de outra coisa: a faixa bordada na testa quer dizer elegância; a liteira dourada, poder: os volumes de Averróes, sabedoria; o enfeite para o tornozelo, volúpia. O olhar percorre as ruas como páginas escritas: a cidade diz tudo aquilo que se deve pensar, te faz repetir o seu discurso, e enquanto crê visitar Tamara não faz mais que registrar os nomes com os quais ela define a si mesma e todas as suas partes.


Como verdadeiramente seja a cidade sob este denso invólucro de sinais, que coisa contenha ou esconda, o homem sai de Tamara sem havê-lo sabido. Fora se estende a terra vazia até o horizonte, se abre o céu onde correm as nuvens. Na forma que o acaso e o vento dão as nuvens o homem já está disposto a reconhecer figuras: um veleiro, uma mão, um elefante...”


trad. livre: LdeM



...



Le città e gli scambi . 2


As cidades e as trocas. 2


“Em Cloe, cidade grande, as pessoas que passam pelas ruas não se conhecem. Ao verem-se imaginam mil coisas um do outro, os encontros que poderiam haver entre eles, as conversas, as surpresas, as carícias, as mordidas. Mas ninguém saúda ninguém, os olhares se cruzavam por um segundo e depois se evitavam, procurando outros olhares, não se fixando.


Passa uma moa que faz girar um guarda-sol apoiado sobre o ombro, e ainda um pouco o círculo das ancas. Passa uma senhora trajada de preto que evidencia toda a sua idade, com os olhos inquietos sob o véu e os lábios trêmulos. Passa um gigante tatuado; um moço com cabelos brancos; uma anã; dois gêmeos vestidos de coral. Qualquer coisa corre entre eles, um mudar-se de olhar como linhas que ligam uma figura a outra e desenham flechas, estrelas, triângulos, até todas as combinações num átimo exaurirem, e outras personagens entram em cena: um cego com um leopardo na coleira, uma cortesã com leque de penas de avestruz, um efebo, uma mulher gorda. Assim entre aqueles por acaso se encontram juntos a se protegerem da chuva sob a marquise, ou se abriga sob um toldo de bar, ou para a escutar a banda na praça, se realizam encontros, seduções, amplexos, orgias, sem que se troque uma palavra, sem que se esgote com uma fala, quase sem levantar os olhos.


Uma vibração luxuriosa move continuamente Cloe, a mais casta das cidades. Se homens e mulheres começarem a viver os seus sonhos efêmeros, cada fantasma tornaria uma pessoa com a qual começar uma história de aprendizado, de fingimento, de equívocos, de choques, de opressões, e o torneio das fantasias se firmaria.”


Trad. livre: LdeM



para ouvir sobre outras cidades invisíveis ...

http://www.youtube.com/watch?v=Bjwlg91dDwY&feature=related

http://www.youtube.com/watch?v=p8O07rFCpuE&feature=related

http://www.youtube.com/watch?v=94R9-i8Y1XU



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