A Crítica e a Poética de Roberto Piva
(sobre a Poética de Roberto Piva (1937-2010)
poeta brasileiro)
Quando toda uma Poética é reduzida a rótulos
A poesia Beatnik
O movimento Beatnik (ou geração Beat) representou um momento de contestação e espontaneidade em plena consonância com a geração pós-guerra, a mesma geração que proclamaria uma 'Contracultura', uma subversão da civilização e uma libertação da libido. Com a grande potência norte-americana em destaque, não é de se admirar que no seio dos próprios EUA surgisse um grupo de literatos e poetas engajados (ou não) em contestação contra o poderio hegemônico da nova potência.
Graças às traduções e releituras críticas de Cláudio Willer, graças à tradução de On The Road feita pelo Peninha (Eduardo Bueno), o movimento Beatnik teve acolhida e influência nos poetas e literatos brasileiros, a partir dos anos 70 – principalmente na chamada 'poesia marginal' e na nova poética surrealista (em contraponto ao concretismo). Com vinte anos de atraso, mas finalmente os poetas brasileiros podem receber a influência beatnik.
Os poetas beatniks mostram uma variedade de estilos e dicções, estão ao lado do ritmo (da batida, 'beat') quanto da 'beatitude' (no sentido de plenitude de viver, não de resignação ou mortificação piedosa) mas enquanto característica geral – se podemos mesmo falar em 'movimento' – temos o fato de se tem duas coisas que todos odeiam são MORALISMO e HIPOCRISIA. Estão disposto a apregoar uma 'Contracultura' – e estamos falando dos EUA pós-guerra – com a guerra na Coreia e as intervenções militares no Caribe, e depois nas selvas do Vietnã – anos 60 e 70.
A Crítica vê o Poeta
A primeira crítica publicada sobre as poesias de Roberto Piva está na Antologia 26 Poetas Hoje, de 1975, organizada por Heloísa Buarque de Hollanda, que aborda os poetas da 'geração mimeógrafo', ditos 'marginais', à margem do sistema editorial e da literatura acadêmica (mesmo que depois muitos se integrassem à academia, como são os exemplos do crítico Robert Schwarz, especialista em Machado de Assis, e do ensaísta Antonio Carlos Secchin, agora na ABL). Outros morreram (o Waly, em 2003) outros se mataram (a Ana Cristina, em 1983), alguns continuam ainda no campo 'excêntrico', vejam o Chacal na ativa.
O crítico João Silvério Trevisan, em 2004, destacava as leituras & influências do poeta Piva,
A entrada em cena de Hölderlin e dos poetas expressionistas alemães Gottfried Benn e Georg Trakl temperaram essa experiência com uma ponta de pessimismo, que deixou de ser circunstancial quando, ainda na década de 60, Roberto Piva teve contato com a obra de um filósofo praticamente desconhecido, no Brasil do período: Friedrich Nietzsche.
À experiência juvenil de Piva agregou-se a contundência desse profeta pessimista e decifrador da alma moderna. Mas nem só de espírito, nem só de intelecto fez-se o aprendizado juvenil de Roberto Piva, que cedo descobriu Rimbaud e Lautréamont, recebendo a influência desses dois poetas visionários, que extrapolam os limites da expressão racional e das escolas literárias.
Trevisan aponta sempre os traços de 'transgressão' na poética de Piva, em consonância com Heloísa Buarque, na antologia dos 'poetas marginais,'
Os traços mais presentes na obra de Roberto Piva giram em torno dessas influências ou ao menos partem delas. Trata-se, antes de tudo, de uma poética de transgressão: na abordagem, na temática e na quebra de fronteiras entre os contrários. Portanto, uma transgressão que desemboca no paradoxo - por exemplo, entre carne & espírito, vida & obra, contemporâneo & arcaico. Sua expressão poética persegue o rastilho da escrita automática de extração surrealista: recuperar para a poesia os estados primitivos do sonho e da loucura.
Aliás, o Germina disponibiliza toda uma 'fortuna crítica' sobre o Piva, majoritariamente sob a óptica da 'transgressão' – enquanto C. Willer (em “A Poesia do Milênio Seguinte”) ressalta dois aspectos: a estilística de Piva e o fato do poeta ter sido 'ignorado', praticamente 'varrido para debaixo do tapete'. Em entrevista (veremos) Piva comenta justamente este 'silêncio' da Crítica, ignorando-o.
Após a leitura de Willer, encontramos a de Maria Estela Guedes também abordando a estilística numa aproximação com a vanguarda surrealista. É no Surrealismo, que a crítica encerra o xamanismo, o esoterismo da Poeta - e de sua Poesia. Os racionalistas concedem um estado de 'não-razão' para encaixar a poesia xamanista-existencial. O 'xamanismo é surrealismo' – e portanto já está datado. Modernismo já está datado. Não é algo além – é um 'estilo de época'. Coisa que Piva, no mínimo, responderia com boas risadas, ou expansivo sarcasmo (que logo seria classificado como 'agressivo sarcasmo'). Xamanismo é outra coisa. É outra forma de ver o mundo. Assim como Budismo não simplesmente não-Hinduísmo, ou o Islamismo não é não-Cristianismo. (Uma identidade X, não uma categoria não-Y...)
Aliás, religião é algo indigesto para o Poeta Piva. Isso de religiosidade e piedade sem o aspecto dionisíaco da vida era um conto da carochinha. A verdadeira religiosidade congrega aspectos de apolíneo e dionisíaco pelo simples motivo que somos apolíneos-dionisíacos, estamos em bipolaridade, ora up ora down, somos excelentes médicos e monstros. Ora beijamos as criancinhas, ora abusamos das criancinhas. Ora salvamos a pátria, ora bombardeamos países inteiros. (Isso de apolíneo-dionisíaco está na Obra de F. Nietzsche quando analisou a tragédia grega e os rituais de Dionísio...)
Os aspectos do Xamanismo são reduzidos a 'alucinação' ou 'estranho' ou 'orgia', mas nada disso se encaixa – uma vez que é outro modo de viver (aliás, sentir) o mundo. Não há palavras em nossa linguagem racionalista para expressar uma viagem de alucinógenos, por exemplo. Os pajés têm toda uma outra percepção de existência que nos escapa. Assim o xamanismo nem seria 'anti-iluminista', mas pré-Iluminismo – assim como as demais religiões (com a exceção do espiritismo-kardecista), quando o xamanismo seria anticartesiano – ao não separar corpo e pensamento, existir e pensar, ao trocar o 'penso, logo existo' pelo 'sinto, logo sou'. O animal-homem não é mais vítima do homem-consciência. Tudo se integra no sentir.
No polo 'transgressão' – que tem ainda o foco sobre a Biografia – temos o ensaio que aborda o homossexualismo do Poeta. E tentam aquela 'leitura de gênero' – há uma literatura de homem branco, de homem negro, de mulher branca, de mulher negra, de homossexual, de lésbica, etc – como se a Arte fosse uma mera coleção de segmentos próprios de cada 'sexualidade' ou 'opção sexual' – havendo um 'modo heterossexual de escrita' ou uma 'escrita homossexual', etc.
Não apenas uma homossexualidade revelada, mas uma homossexualidade AGRESSIVA, onde o reprimido se volta com agressão contra a sociedade repressora. Alguns críticos batem nessa tecla sem escrúpulos. Como se o escritor homossexual precisasse agora dar um 'revide' nos 'normais', padronizados – atacando a cultura (a Cultura golpeada pela Contracultura ) mas somente uma cultura pode 'substituir' uma outra cultura, não basta 'criticar'. Tanto que depois de aliviar a repressão depois dos anos 60 e 70, com a liberação da libido, a burguesia conservou a civilização da exploração da mais-valia. Mudou para continuar o mesmo. Invalidou assim as críticas de Marcuse e Reich, por exemplo, ao conceder a liberdade de sexo e mercado, e negar a autonomia política.
É como se o autor 'pervertido' precisa defender-se atacando – daí o 'desprezar' os piedosos, os certinhos, os que vivem no 'senso comum' – tal como explícito no poema "A Piedade", segundo a crítica de Adriano Bitarães Netto, no Estudo de Obras Vestibular UFMG 2008, que cita o poema,
eu iria a bailes onde eu não poderia
levar meus amigos pederastas ou barbudos
eu me universalizaria no senso comum e
eles diriram que tenho todas as virtudes
eu não sou piedoso
eu nunca poderei ser piedoso...
e em seguida assim julga a 'poética' de Piva dentre os demais 'marginais',
“A escrita de Piva é feita para 'desauralizar' a santidade de um sociedade hipócrita, para desestabilizar os valores 'éticos' que são instituídos sem qualquer ética. Por isso seus textos agridem uma sociedade que é extrememamente agressora, ferem os ouvidos de quem se julga 'ingênuo', 'digno', 'prudente'. Essa violência (sic) aparece em sua poética principalmente por meio de takes que retomam artistas, muitos dele marginais, considerados como 'transgressores' ou 'pervertidos' sexuais [...]”
aqui o crítico lembra a questão da 'perda da aura' do poeta, tematizada em Baudelaire e analisada por Walter Benjamin, filósofo judeu-alemão leitor atento do flâneur parisiense, à cerca do momento moderno quando a Arte perde a 'aura' e se integra como mais uma mercadoria. Em seguida mostra com coerência que Piva despreza a hipocrisia reinante – mas então desliza feio quando aponta uma 'violência' na fala poética – enquanto a violência é do sistema que vem coagir a espontaneidade – o poeta é antes uma vítima que esperneia diante dos golpes da repressão! A 'violência' é da instituição – não do Poeta! O rótulo de 'pervertido' é dado pelo 'instituído' não pelo eu-lírico.
Tal visão do Outro enquanto Agressor ('eu sou o perverso e detesto o normal', p.ex.) diminuíria a abrangência da poética do 'marginal' Piva, segundo alguns leitores ( e críticos). Mas preconceito por preconceito, tal fato revela antes a perpetuação de rótulos – e segmentação de mercado, onde gays leem autores GLS, e os heterossexuais leem os autores do Movimento Machão Mineiro (MMM). A Literatura perde um tom universal e se dividem em gêneros – literatura GLS, feminista, negra, asiática, etc, o que mostra a explosão de particularismo (e se dizendo 'multiculturalismo, pluralidade, um everest de nomes pomposos...)
Ora, os autores que amamos não escrevem para 'segmentos de mercado' – ainda que identificações existam – pois não vamos ler Whitman porque ele é homossexual (ou bissexual), mas porque é o grande poeta Whitman. E não apenas homossexuais (e/ou bissexuais) leem Whitman, pelo contrário! (Caso fosse assim, antes de ler um autor eu teria que pesquisar qual a opção sexual do artista, e caso ele/ela não se encaixe na 'minha opção', então é ignorado, descartado.)
Seria cômico (quando não trágico) se alguém dissesse não ler mais o Proust porque o 'romancista da memória' era um homossexual, ou queimar livros de Oscar Wilde em praça pública porque 'atenta contra a moralidade'. Passamos esta época (ou esperamos ter passado...)
Sorte nossa é que o crítico se apercebe disso, quando deixa claro,
Sua escrita, no entanto, não é militante, mas crítica. Segundo o próprio poeta, essa idéia de “se assumir” gay, lésbica é uma reprodução de um modelo bancário de sociedade, que tenta dividir as coisas, rotular para controlar. Dizer como cada um deve ser e se comportar. Sua afirmação da homossexualidade se dá pela primazia do sexo como manifestação e afirmação da potência de vida, exercício da liberdade sobre formas repressoras de controle social.
Impressionante como a nossa instância Crítica precisa de 'rotulações' e compartimentos – assim a equação homossexualidade = transgressão se colou à Poética de Piva – e não saiu nem depois da morte do Poeta! Reduz toda a Obra a uma dúzia de subtemas e subtítulos e estamos conversados. O Poeta deve ser logo catalogado.
Assim a Crítica sobre a Poesia de Piva oscila ora entre a Biografia – o poeta porra-louca – ou a tentativa de encaixar a Poética numa órbita já 'catalogada' (o Surrealismo, por exemplo), sem adentrar o 'universo simbólico', ou seja, sem realmente SENTIR a Obra. Não se trata de julgar, ou compreender (quem compreende quem?), mas de se colocar na PERSPECTIVA do Poeta. Ao se ler um poema o/a leitor/a sentirá em si SER o/a Poeta.
A experiência da Leitura é a Alteridade – o sentir-se outro. Rimbaud já dizia, “Eu sou um Outro” (“
Je suis un autre”) e o leitor sai de sua prisão mental e re-vivifica o/a Poeta – quando eu leio Whitman, EU SOU Whitman, quando eu leio Álvares de Campos (Fernando Pessoa) EU SOU Álvares de Campos. Eu estou diante da Tabacaria, eu mesmo entoo canções em honra de mim mesmo.
Ser o Outro é aceitar o Outro, é mudar de Perspectiva – é deixar a condição de 'homem unidimensional' (como diria Marcuse) e ter um olhar em prisma, em perspectivas várias, assim como deseja o Whitman, que percebia contradizer porque elee era capaz de 'conter multidões' dentre de si mesmo. O Canto a Mim Mesmo seria um manifesto de egocentrismo e individualismo caso não tivesse esse valor pluralista.
No mais, definir Piva – ou qualque outro poeta/artista - como 'marginal' é uma forma de encaixar o Poeta em algum rótulo, em algum canto da sociedade – mesmo que fora! 'Marginal' como assim ? Que identidade é essa? Um menino da FEBEM gosta de ser chamado de 'marginal' ?
Definir se Piva é 'direita' ou 'esquerda' – se é revolucionário ou contra-revolucionário – é tentar politizar através de rótulos o que é mais amplo que as questões de ação política. A Poética de Piva é um desabafo mais que um panfleto – e muitas vezes ele mesmo ironizou as 'plataformas políticas' – basta ver os Manifestos – o “Manifesto Utópico Ecológico em Defesa da Poesia e do Delírio” e o “Manifesto da Poesia Xamânica e Bio-Alquímica”,
Os partidos políticos brasileiros não têm nenhuma preocupação em trazer a UTOPIA para o quotidiano. Por isso em nome da saúde mental das novas gerações eu reivindico o seguinte:
1 - Transformar a Praça da Sé em horta coletiva & pública.
2 - Distribuir obras dos poetas brasileiros entre os garotos (as) da Febem, únicos capazes de transformar a violência & angústia de suas almas em música das esferas.
3 - Saunas para o povo.
[...]
O que a poesia 'xamânica' demonstra é que a Civilização (Kultur) só é possível devido a repressão dos intintos, através da 'renúncia instintiva' – principalmente libidinal, sexual – que abafa o animal humano com uma consciência moral. E quando se quer seguir o animal é o sujeito logo rotulado de 'bárbaro' – e passa a sofrer a culpa (ou o 'mal-estar na civilização', como dizia Freud)
Aqui temos um Piva já encaixado numa 'tradição' (ou seja, depois de 50 anos, os beatniks já são clássicos!) Segundo o prof. Pécora (Alcir Pécora, literato da Unicamp) citado por Grings, Piva seria um leitor voraz, compulsivo, igual a um Álvares de Azevedo, um Dostoiévski, um Baudelaire, um Borges, um 'antropófago' da literatura alheia igualzinho a um Oswald de Andrade. A tecer um 'rol de citações' o Poeta entra naquele dialoguismo, naquela intertextualidade que mostra um debruçar metalinguístico da literatura sobre o próprio fazer literário. “Ler Piva é se deparar com literatura embebida em literatura que fala o tempo todo de literatura”. Assim, a obra de Piva é literatura de absorção de influências, não apenas um delírio iconoclasta ou transgressão de um homossexual reprimido. Tem um valor literário – não é mero desabafo para ruborizar mocinhas inocentes e piedosas senhoras.
Em Paranoia, isso fica muito claro com orfeus amortalhados, Dotoiévskis em ciclone de almofadas, anjos de Rilke dando nos mictórios e a estátua de Álvares de Azevedo sendo devorada pela paisagem de morfina. Lá está também García Lorca, à espera do seu dentista ou num hospital da Lapa, e até mesmo Rimbaud, passeando na Praça da República. Piva gosta de incorporar explicitamente suas referências, dando nome aos bois e deixando atordoado o leitor médio com um incontável rol de citações.
A Poética de Piva então toma corpo literário a ponto de sair do biografismo – sobreviver ao Autor – aqui tem validade LER a Obra mais do que preocupar-se com as opções sexuais de quem escreve/declama. A Obra tem valor em si-mesma? Então vamos ler. Assim o texto de Grings tem um grande valor aqui ao ser escrito em março de 2010, durante a crise fatal que vitimou o poeta. (Roberto Piva passava por internações, devido ao mal de Parkinson)
Após a morte do Poeta
No blog de Celso Barbieri, temos uma postagem de 3 de julho dedica um espaço a rememorar a importância cultural de Roberto Piva, não apenas na literatura, na poesia, mas na música, na Contracultura.
Mas o mais interessante é uma entrevista dada por Piva ao Ricardo Lima, que propõe perguntas que remetem às críticas de Pécora, sobre a contextualização da poética de Piva na 'geração Beatnik', influências de Whitman e Fernando Pessoa, além de uma não-inserção no concretismo ou na 'tradição cabralina' (de João Cabral de Melo Neto),
RL: Seus primeiros livros (em 1963 e 1964), conforme nos apresenta Alcir Pécora no prefácio da obra reunida, tem um "viés beat, whitmanniano e pessoano". Você ignora o concretismo, não adere à poesia participante, de conteúdo social e, tampouco, segue a secura da tradição cabralina. O verso livre, desprovido de toda e qualquer regra, era também um grito de liberdade naquele momento de sufoco e repressão?
RP: Que sufoco? Isso era muito relativo, os militares não ficavam atrás de você o dia inteiro. Eles ficavam lutando bang-bang com os terroristas e deixavam o resto da população em paz. O verso livre tem a ver, antes de mais nada, com o estilo da minha vida.
Aqui o Poeta deixa claro que não escreve para os outros, mas por ser a escrita parte integrante da vida – do modo de vida – e não vive em referência à estilos de época – seguir um movimento poético. Por isso é difícil encaixar o Piva num dado movimento – ele é beatnik? É surrealista? É o que? É subversivo, mas não é engajado? É subversivo, mas não é terrorista? Se julga acima dos comunistas (“os comunistas são piedosos”) se julga acima dos religiosos, os normalpatas ? Como assim se 'julga acima'? O poeta não está numa 'torre de marfim' – dá aulas, é professor, luta para sobreviver, tem uma doença crônica – conhece o mundo em que vive – a condição histórica da condição humana. O desejo do Poeta? Viver o próprio modo de vida – sem restrições – e não contra quem quer que seja.
Na entrevista, Piva ressalta também o silêncio da crítica que insistia em ignorar um Poeta que não enquadrava em 'rotulações', o que desafia o próprio 'saber crítico' que se sente incapaz de 'conter multidões' ou 'multiplicidades de interpretações', como é notório na própria Poesia,
RL: Segundo Alcir Pécora, esse primeiro momento já traz algumas características marcantes da sua "poesia explosiva": o jogo de extremos e a escolha do autor ("condição desta escrita libertina"); a centralidade do sexo e a tangência do sagrado ("ato profanatório ou excesso amoroso e orgiástico"); e, por fim, a recusa ao sentido (a incompreensão como "um tipo de violência exigida pelo verso novo contra o comodismo"). Como a crítica, na época, reagiu a essa novidade poética?
RP: Ela não reagiu. Não saiu nada. O Pasolini, depois de cineasta famoso, publicou um livro que foi ignorado. Ele mesmo teve que fazer uma resenha, com pseudônimo, para chamar atenção da crítica e ter o trabalho reconhecido.
Na edição de 4 de julho deste ano (2010) o jornal Globo (online) assim anuncia a morte do poeta (esquecido, sem recursos num leito de hospital) “Morre aos 72 anos o poeta Roberto Piva, grande nome da poesia marginal” - até no obituário do poeta os jornalistas não podem deixar de colocar um rótulo – então Piva é isso aí? Um 'poeta marginal'. Na verdade, ele não é marginal – ele não está à nossa margem , nós é que estamos à margem dele.
No mais, a Poesia é uma Arte para poucos - “agora, você está assustado que a Poesia é uma arte minoritária? Ela sempre vai ser uma arte minoritária...!” dizia o próprio Piva. A Poesia não feita por gente que apenas lê poesia – ler é um dos pilares! - mas por gente que vivencia a Poesia, que é possesso pela Poesia, que incorpora a fala xamânica da Poesia!
Set/10
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