Jack
Kerouac
Lonesome
Traveller
Viajante
Solitário
trad.
Eduardo
Bueno
LP&M,
2006
“Insensatos
ferroviários,
o
condutor,
o
velho
John
J.
Coppertwang,
35
anos
de
puro
serviço
na
velha
S.P.
[Southern
Pacific],
está
lá
na
manhã
cinzenta
de
domingo
olhando
para
seu
relógio
de
ouro,
parado
junto
à
máquina,
gritando
bobagens
para
o
velho
maquinista
Jones
e
para
o
jovem
foguista
Smith,
que,
com
seu
boné
de
beisebol,
está
sentado
no
lugar
do
foguista
ruminando
um
sanduíche
– 'O
que
acharam
do
velho
Johnny
ontem,
acho
que
ele
não
marcou
tantos
pontos
quanto
imaginávamos'.
'Smith
apostou
seis
dólares
lá
na
agência
de
Watsonville
e
disse
que
ia
descolar
34.'
'Também
dei
uma
chegada
nessa
agência
-.'
Tinham
passado
nas
agências
de
aposta
da
vida
matando
o
tempo,
longas
noites
de
pôquer
nas
casas
de
madeira
escura
da
linha
férrea,
você
pode
sentir
na
madeira
o
cheiro
do
charuto
mastigado,
a
escarradeira
está
ali
há
mais
de
750.099
anos,
o
cão
entra
e
sai,
e
velhos
rapazes
se
reclinaram
resmungando
sob
a
luz
mortiça
e
acastanhada,
e
jovens
rapazes
também,
com
seus
uniformes
novos
de
guarda-freios
dos
trens
de
passageiros,
o
nó
da
gravata
desfeito,
o
casaco
jogado
nas
costas,
o
luminoso
sorriso
juvenil
de
ferroviários
felizes,
fátuos,
bem-alimentados,
bem
empregados,
fazendo
carreira,
futuros
pensionistas
hospitalizados
e
cuidados.
-
35,
40
anos
assim,
e
chegam
a
condutores,
e
durante
anos
foram
chamados
no
meio
da
noite
pelo
chefe
do
pessoal
aos
gritos:
'Cassady?
É
a
semana
dos
trens
locais
e
arranjei
uns
horariozinhos
especiais
para
você',
mas
agora
que
envelheceram,
tudo
o
que
têm
é
uma
ocupação
fixa,
um
trem
fixo,
o
condutor
do
112
com
relógio
de
ouro
está
soltando
piadinhas
para
todos
os
cachorros
loucos,
inflamáveis,
demoníacos
Willis
maquinistas,
uau,
o
sujeito
mais
audacioso
desse
lado
da
França
e
frankincense,
era
conhecido
por
ter
conduzido
sua
locomotiva
ladeira
acima...
7h15,
hora
de
partir,
corro
pela
estação
ouvindo
o
sino
tocar
e
o
vapor
assobiando,
eles
estão
partindo,
oh,
voo
pela
plataforma
e
esqueço
momentaneamente
ou
talvez
nunca
tenha
sabido
qual
a
linha
que
devo
tomar
e
rodopio
confuso
por
um
instante
pensando
qual
linha
e
não
consigo
ver
trem
algum,
e
é
nesses
instantes
que
desperdiço
cinco,
seis,
sete
segundos,
que
o
trem,
embora
já
em
movimento,
está
apenas
começando
a
soltar
vapor
devagar,
e
até
um
gordo
ferroviário
poderia
facilmente
dar
uma
corrida
e
apanhar
o
trem,
mas
enquanto
grito
para
o
subchefe
da
estação:
'Onde
está
o
112?',
e
ele
responde
que
está
na
última
linha,
que
é
a
linha
que
jamais
sonhei
que
pudesse
ser,
corro
para
lá
o
mais
rápido
que
posso,
driblo
as
pessoas
como
um
atacante
do
Columbia
e
irrompo
nos
trilhos
rápido
como
quem
se
livra
da
marcação,
quando
você
carrega
a
bola
consigo
para
a
esquerda,
faz
finta
com
o
pescoço
e
a
cabeça
e
avança
com
a
bola
como
se
você
fosse
se
arremessar
e
sair
voando
à
esquerda,
e
todo
mundo
psicologicamente
segue
esbaforido
com
você
naquela
direção,
e
de
repente
você
se
contrai
,
como
uma
baforada
de
fumaça,
você
se
mete
por
entre
os
adversários
que
tentam
agarrar
você,
jogada
de
desvio,
você
voa
pela
brecha
quase
antes
que
você
mesmo
perceba,
e
lá
estou
eu
voando
para
os
trilhos,
e
lá
está
o
trem
a
uns
trinta
metros
de
distância,
no
exato
instante
em
que
olho
ele
começa
a
ganhar
uma
tremenda
velocidade,
velocidade
que
eu
poderia
ter
acompanhado
se
tivesse
olhado
um
segundo
antes
– mas
corro,
sei
que
posso
apanhar
ele.
Em
pé
na
plataforma
traseira
estão
o
guarda-freios
da
traseira
e
um
velho
condutor
lerdo,
o
velho
Charley
W.
Jones,
um
sujeito
que
teve
sete
esposas
e
seis
filhos
e
uma
falta
em
Lick,
não,
acho
que
foi
em
Coyote,
ele
não
conseguia
enxergar
por
causa
do
vapor,
e
sai,
e
sua
lanterna
depara
com
a
forma
de
iglu
da
válvula
de
escape
do
meu
precursor,
e
deram
a
ele
quinze
benefícios,
de
modo
que
agora
ali
estava
ele
na
manhã
de
domingo
ha-ha-ulalá,
e
ele
e
o
jovem
guarda-freios
da
traseira
observam
incrédulos
o
aprendiz
de
guarda-freios
correndo
como
um
atleta
louco
atrás
do
trem
que
parte.
Me
deu
vontade
de
gritar:
'Façam
o
teste
do
ar,
façam
o
teste
do
ar
agora!',
pois
sabia
que
,
quando
um
trem
de
passageiros
parte,
mais
ou
menos
na
altura
do
primeiro
cruzamento
a
leste
da
estação,
o
maquinista
sinaliza
e
deixa
escapar
um
pouco
de
ar
para
experimentar
os
freios,
e
isso
reduz
momentanea-
mente
a
velocidade,
o
que
me
permitiria
apanhar
o
trem,
mas
não
fizeram
o
teste
de
ar
os
bastardos,
e
agora
sei
que
terei
que
correr
como
um
filho-da-puta.
Mas
de
repente
me
sinto
pouco
à
vontade
pensando
no
que
todos
os
demais
vão
dizer
ao
verem
um
homem
correr
alucinadamente
rápido
com
todas
as
suas
forças,
em
um
pique
feroz
como
Jesse
Owen
[atleta
norte-americano,
campeão
olímpico],
só
para
apanhar
um
maldito
trem,
e
todos
eles
histéricos
a
se
perguntar
se
morrerei
ao
atingir
a
plataforma
traseira,
e
blam,
caio
estatelado
e
inerte
no
cruzamento,
de
modo
que,
quando
o
trem
acabar
de
passar,
o
velho
com
a
bandeira
verá
que
tudo
jaz
no
solo
na
mesma
confusão,
todos
nós
anjos
morreremos
e
nem
sequer
sabemos
como
nem
conhecemos
nosso
próprio
diamante,
oh,
que
os
céus
nos
iluminem
e
abram
nossos
olhos
– abram
nossos
olhos,
abram
nossos
olhos.
-Sei
que
não
vou
me
machucar,
confio
nos
meus
sapatos,
na
força
de
minhas
mãos
e
pés,
na
solidez
de
minhas
garras
para
agarrar
e
no
meu
vigor,
e
não
preciso
de
nenhuma
força
mística
para
avaliar
a
musculatura
de
minha
caixa
torácica
– mas,
com
os
diabos,
é
socialmente
muito
constrangedor
ser
apanhado
correndo
como
um
maníaco
atrás
de
um
trem,
ainda
mais
com
dois
sujeitos
embasbacados
na
traseira
do
comboio,
sacudindo
a
cabeça
e
gritando
que
não
vou
conseguir,
mesmo
comigo
correndo
friamente
atrás
deles
de
olhos
abertos
tentando
informar
que
posso
conseguir
e
que
eles
não
devem
ficar
histéricos
nem
rir,
mas
então
percebo
que
aquilo
tudo
é
demais
para
mim,
não
a
corrida,
não
a
velocidade
do
trem,
que,
de
qualquer
modo,
dois
segundos
depois
de
eu
desistir
da
complicada
perseguição,
de
fato
diminuiu
no
cruzamento
para
o
teste
de
ar
antes
de
acelerar
definitivamente
em
direção
a
Bayshore
Highway.
Por
isso
cheguei
tarde
ao
trabalho,
e
o
velho
Sherman
me
odiou
e
ainda
haveria
de
me
odiar
mais.”
pp.
68-71
trecho de
“A
terra
das
ferrovias”
trad.
Eduardo
Bueno
LP&M,
2006
Lonesome
Traveller
1960
/
Viajante
Solitário
Jack
Kerouac
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