Sobre os poemas do poeta Diovani Mendonça
(divulgados em blogs, zines, embalagens de Pão e Poesia)
Poeminhas para distrair dor de dente
Diante da necessidade de poemar infindamente os Poetas precisam de um suporte espiritual ou material, virtual ou em celulose para os seus registros de versos que não podem ficar apenas dispersos ao vento. Ainda que os melhores versos realmente sejam levados pela brisa noturna meio ao resmungar solitário entre andanças e angústias, não podemos privar os leitores de conhecerem ao menos alguns versos, não que sejam os menos, ou até os piores.
Divulgar é uma arte tão sutil quanto rascunhar, rabiscar, esboçar versos e versinhos, poemas e poeminhas num papel ou no monitor do PC, no aconchego do lar ou no tumulto de lan house, o importante é registro o mínimo da produção poética. Aquele poema que surgiu e sumiu no sonho ou pesadelo, aquele que foi declamado ao pé de uma árvore paradisíaca ou na parada de ônibus, poemas mil que se perderam.
Divulgar é uma perenização de 1% que a produção ousou, a imaginação conquistou, o papel ou monitor absorveu. Poucos vão tomar conhecimento, poucos vão abrir o e-mail, poucos vão ler realmente. Mas o poeta não pode desanimar. Se os versos não são os melhores - e sim aqueles que foram mentalizados no banho quente da manhã ou no momento orgásmico do amor - não vamos privar os seletos leitores de uma amostra grátis do que poderíamos ter escrito.
Insights, intuições, psicografias, os nomes são inúmeros para retratar os momentos de iluminação que rasgam o cotidiano do/a poeta quando ele/ela produz os versos que alguns nunca vão ler mas outros nunca vão esquecer. "Uma flor nasceu na rua!" - em que momento da pacata vida de Drummond ele pensou esse verso tão simples e tão extraordinário! Uma flor em pleno asfalto! Uma beleza em plena fuligem! E se ele não divulgasse? Seríamos hoje muito mais pobres de espírito (e percepção!)
Assim a divulgação múltipla da poesia é plenamente necessária e aplaudida. Seja em papel, em xerox, mimeografo, pacote de pão, blogs, dentro do metrô, dentro do ônibus, tipo, você entra num metrô e eis um poema, você embarca num ônibus e eis um poema, ali, balançando, bolinando entre as suas pernas, vai comprar um pão e - opa! - um poema! O poema derramado pra todo lugar, de repente, nunca esperado, solicitando atenção - um minuto de vossa atenção! Um minutinho só!
Necessária e merecedora de aplauso as iniciativas do poeta, empreendedor e agitador cultural Diovani Mendonça - mais encontrável no blog www.diovmendonca.blogspot.com , mas circulando por aí em pacotes de pão, garrafas plásticas, edições em cartaz do Mulheres Emergentes, ministrando aulas de poesia nas escolas particulares e da rede pública, dormitando sob a Árvore dos Poemas carregada de frutos-poemas.
O Poeta que distribui seus pequenos poemas (e há também os extensos) nas mil mídias citadas, além de distribuir garrafas pet com versos - aqueles very old manuscritos numa garrafa que tanto atraia a curiosidade do jovem Edgar Allan Poe a imaginar mil mensagens de piratas e tesouros - em visitas e saraus meios aos comportados, disciplinados, mas também alvoroçados alunos, no projeto Pão e Poesia nas Escolas.
Os poemas mínimos de Diovani Mendonça procuram captar um momento e dizer algo a respeito, algo que mereça ser dito, nem que venha soar infantil, óbvio e inútil. Uma poesia simples para distrair do cotidiano - e apontar a mesmice - para descrever uma sensação e fotografar algo no fluxo do tempo - nem que seja para fazer esquecer uma dor de dente.
Poesias que nascem da leitura de poesia, quando o poeta não nega suas influências - a síndrome da influência, como diria o crítico literário Harold Bloom - quando segue trilhas já pisadas ou quando se desvia curioso por outras sendas, perigosas veredas, criando um mundo novo - como fez o notável Guimarães Rosa - com outro trajeto, outros mapas, outros pontos de referência. Assim vai seguindo o Poeta na Estradinha Carlos Drummond de Andrade,
“No meio do caminho do poeta
tinha uma pedra, tinha uma pedra.
Tinha sim, uma pedra;
bem no meio do caminho dele."
e reconhece a influência palpitante, tropeçante, palmilhante,
E que estilingue a primeira pedra,
quem disser que sou plagiador.
Que aproveito da fama do Poeta.
Eu, mero peão, doido de pedra e por pedra.
E o Poeta não "luta com as palavras" (a "luta mais vã", segundo o mesmo CDA), decidido a esperar distraído que as palavras se aproximem e venham brincar, "Tudo bem... admito: / sou mesmo / orelha seca / com as palavras. // Por isso / não brigo / mais com elas / só brinco, / : bijuterias:", onde brincando com as palavras, levemente, distraidamente, é capaz de construir a leveza, a insustentável leveza, da poesia,
Não me levem
demasiado a sério.
É que um vento antigo,
traquina e moleque,
desses de empinar papagaio
de taquara e seda no azul,
tem despenteado o leque
no abanar meus pensamentos.
(Papagaiado)
onde o Poeta não pretende forçar as palavras (nem o leitor) a um formato, a um estilo ou estética, mas soltar-se justamente dessa visão acadêmica (e formatada) de fazer poesia. É a mesma empolgação dos modernistas, de Manuel Bandeira, de Mário de Andrade, ou atualmente um Manoel de Barros, quando querem subverter esses academicismos com poemas leves (e também CDA quando começou a carreira, ou alguém já se esqueceu da pérola "Cidadezinha Qualquer"? "Um homem vai devagar. Um cachorro vai devagar. Um burro vai devagar. Que vida besta, meu Deus")
Assim também é "Auto-elogio à minha alma-palhaça", onde a escrita é uma carícia de uma pena desde dentro, "Não tenho penas. /Tenho pernas. / Por isso:/ sei andar e não voar.// Mas sei que penas / de outra natureza, / também moram / dentro de mim", é quando o poeta quer voar, aprender a voar, em ânsias de voar, e a poesia é que acaba batendo asas alçando voo...
Os poemas de Diovani Mendonça são de fácil digestão. Não são simplistas nem simplórios, são simples. Poeminhas. Não que sejam insignificantes. Isso já deu vazão há inúmeras e infrutíferas discussões. Como se poemas mínimos fossem poemas desprezíveis. (Coisa que José Paulo Paes demonstrou ser irreal quando ousava os famosos micro-poemas cômicos e irônicos, insistindo em brincar com as palavras)
Passarinho fofoqueiro
Um passarinho me contou
que a ostra é muito fechada,
que a cobra é muito enrolada,
que a arara é uma cabeça oca,
e que o leão marinho e a foca..
xô , passarinho! chega de fofoca!
em http://www.secrel.com.br/jpoesia/jpaulo.html
Onde a poesia é mais tecida de sensações do que de pensamentos. Ou seja, não é racional. Mas não que o poeta despreze a racionalidade. Pode fazer um poema 'racional' contra o 'racionalismo', o que lembra um Fernando Pessoa, um Moacyr Félix, um Ferreira Gullar",
Há certas coisas que, após entendidas,
necessitam de muito mais explicações
e perdem o mistério, a graça e o encanto
diante da revelação.
Pois há sempre um elemento de encanto e mistério diante da transitoriedade, da efemeridade, que perdemos é tempo tentando explicar (será devido a metafísica?),
Creia-me;
tudo passa, tudo gira, na órbita do transitório.
e
O que ainda não passou
é porque a flecha do esquecimento
está atravessando o tempo rumo ao alvo
onde tudo é nada, onde nada é tudo.
Tudo, nada; nada, tudo
no infinito mistério.
O que desperta lembranças de F. Pessoa quando dizia passarem os filósofos, mas permanecerem os poetas.
Inspirado pelo expressionismo de Van Gogh, sob o sol inclemente da pintura, Diovani tece o seu ensolarado "Fogaréu",
e acima do chão sair pelas ruas
cuspindo palavras de fogo
nos transeuntes presos no iceberg
da indiferença urbana que a cada dia
cresce como o derretimento
das calotas polares.
Segue o poeta sob o sol abrasador, em pleno aquecimento global, sofrendo a prisão da realidade que muda apenas para continuar a mesma, em asfalto e buzinas, poluição e ambições, corajoso para
Quebrar as algemas / no cinturão da lei. // cortar as veias da lucidez / das
minhas orelhas // cansadas de ouvir os ruídos / do mundo em ruínas // e
mudo deixar / sangrar meu gesto // enquanto me abraça uma camisa
de força.
Vejam no blog www.diovmendonca.blogspot.com
Derramando a poesia para os transeuntes, para os reacionários, para os libertinos, para as donas de casa em plena padaria, para os mendigos na Praça Sete, para os beatniks no Parque na tarde de domingo, assim divulgando a PoPoesia a pulular no dia-a-dia para fora dos gabinetes, para fora das torres de marfim, para fora dos livros amontoados nas estantes (quero dizer, estantes abarrotadas de livros que não passam de objeto de decoração), para que a poesia possa sair por aí em andanças, peregrinando, gritando, ainda que seja para poucos ouvidos (pois nem todos que ouvem, entendem, sejamos óbvios)
A poesia / tem / que / ser pop / pular na panela / de pressão... / da realidade
e conclui
A poesia / tem / que/ ser pão / /e/ / para / todas as bocas
Assim seja. Pois se depender do poeta e agitador cultural Diovani Mendonça, à sombra da Árvore dos Poemas e degustando Pão e Poesia, assim será.
dez/08
revsd: fev/12
por
Leonardo de Magalhaens
http://leoliteraturaescrita.blogspot.com
http://meucanoneocidental.blogspot.com
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